Indicadores
Se as gorjetas param de chover, há algo de errado com a economia. Parece piada, mas é exatamente essa a lógica por trás do chamado Stripper Index (“índice das strippers”). Trata-se de um indicador informal, e um tanto sarcástico, utilizado para medir o pulso da economia através de um critério inusual: as gorjetas e ganhos de dançarinas de striptease e outros profissionais do entretenimento adulto. Em outras palavras, quando os clientes somem dos clubes noturnos e as notas deixam de cair no palco, pode ser um sinal precoce de que uma recessão econômica está a caminho.
Apesar do tom curioso, o assunto é levado cada vez mais a sério por analistas. Até Hollywood já fez referência a fenômenos semelhantes: no filme “A Grande Aposta” (The Big Short, 2015), que retrata a crise de 2008, uma cena memorável mostra uma stripper revelando ter financiado várias casas próprias. Mas afinal, o que é o Stripper Index e como as strippers podem antecipar uma crise antes dos economistas tradicionais?
O Stripper Index ganhou fama após a crise financeira de 2008 como um termômetro improvável da economia. Diferentemente dos indicadores clássicos, como PIB, inflação ou desemprego, este índice informal foca em algo bem específico: a renda de profissionais do setor, especialmente o volume de gorjetas em dinheiro que elas recebem dos clientes.
Assim, uma queda acentuada nos ganhos de strippers e demais trabalhadores pode indicar que o público está apertando os cintos. Menos clientes nos clubes e gorjetas mais magras sugerem que as pessoas estão segurando dinheiro e evitando gastos desnecessários, exatamente o que ocorre nos estágios iniciais de uma desaceleração econômica.
E se os analistas costumam acompanhar a política monetária do Federal Reserve, as decisões de juros do Banco Central do Brasil ou as oscilações de Wall Street e da B3 para medir o pulso das finanças, o ambiente dos clubes noturnos também pode oferecer pistas valiosas sobre o que vem pela frente.
Para entender a origem deste indicador, vale voltar aos anos que precederam a Grande Recessão de 2008. Na época, poucos analistas prestavam atenção nesses sinais “alternativos”, mas eles já existiam.
A crise de 2008 acabou dando respaldo retroativo a esse “índice das strippers”. Após o estouro da bolha imobiliária, ficou evidente que o gasto em serviços e entretenimento adulto já vinha caindo nos anos anteriores. Estudos financiados pelo próprio governo dos EUA encontraram indícios de que, entre 2003 e 2007, o tamanho da economia do setor (em especial a parte informal, não regulamentada) encolheu na maioria das grandes cidades americanas, uma tendência de baixa consumo que antecipou a recessão. Em suma, se os economistas tivessem prestado atenção nas boates vazias, poderiam ter visto a tempestade chegando.
Esse tipo de indicador inusitado foi até parar na cultura pop: no filme “A Grande Aposta” (The Big Short), que satiriza a cegueira do mercado antes da crise, há uma cena em que investidores descobrem que uma stripper em Miami possui cinco casas próprias financiadas por hipotecas subprime. A revelação arranca risos amarelos, como assim até strippers estavam especulando no mercado imobiliário?! Mas serve de alerta de que o sistema inteiro estava desajustado. Na vida real, embora de forma diferente, as strippers também deram seu alerta: a renda delas despencou antes da crise de 2008 estourar oficialmente. Infelizmente, poucos levaram a sério esses sinais na época.
A razão de ser do Stripper Index está ligada ao conceito de gasto discricionário, ou seja, o dinheiro que sobra após pagar contas essenciais (moradia, alimentação, contas de luz, água, impostos etc.). É com essa renda extra que consumidores financiam pequenos prazeres e luxos: jantar fora, viajar, comprar gadgets, hobbies e, para alguns, visitas a clubes de strip ou serviços relacionados. Quando a economia vai bem, muita gente tem folga no orçamento para essas atividades de lazer. Mas quando há pressão econômica, inflação em alta, salários estagnados, medo de desemprego, esse tipo de gasto é rapidamente reduzido ou eliminado.
Portanto, faz sentido que strippers e trabalhadores de casas noturnas sejam os primeiros a perceber os ventos da recessão: seu faturamento depende justamente do dinheiro sobrando no bolso dos clientes. Diferentes dos indicadores oficiais (que demoram meses para refletir mudanças), elas notam quase em tempo real quando o movimento cai. Uma boate vazia em plena sexta-feira ou clientes economizando gorjetas podem ser indícios de que o público está preocupado com as finanças.
Esse fenômeno também ressalta algo importante: gastos com lazer são opcionais. Em recessões, pagamos primeiro o que é indispensável e adiamos divertimentos. Se até um setor como o do entretenimento adulto, conhecido por movimentar muito dinheiro em tempos bons, sente um baque, é sinal de que o consumidor médio está segurando cada centavo. Nesse sentido, o Stripper Index, por mais inusitado que pareça, reflete de forma bem real o comportamento coletivo em épocas de vacas magras. A economia, afinal, também pode ser medida nas pequenas decisões do dia a dia, como deixar de pedir aquela cerveja artesanal… ou de pagar por um show particular na boate.
Nos últimos anos, especialmente a partir de 2022, multiplicaram-se as observações de que o movimento em clubes de striptease e casas noturnas nos Estados Unidos já não é o mesmo dos tempos de bonança. Proprietários e profissionais do setor relatam quedas nas gorjetas, menos clientes e um público mais cauteloso com os gastos — sinais que, para muitos, refletem mudanças na confiança do consumidor.
Cidades simbólicas como Las Vegas, que tradicionalmente atraem grande fluxo para o entretenimento adulto, viram suas receitas encolherem em 2023 em comparação com anos anteriores. Em alguns estados, analistas independentes também notaram que bordéis e clubes legais registraram retrações no faturamento, ao mesmo tempo em que aumentaram os relatos de clientes tentando negociar preços ou optar por serviços mais baratos.
Um exemplo vem da Europa, onde Catherine De Noire, gerente de um bordel legal, influenciadora e doutoranda em psicologia organizacional, afirma que uma queda inesperada nos negócios costuma ser um sinal de que a economia está em apuros. Para ela, o impacto global dos Estados Unidos é decisivo: turbulências na maior economia do mundo geram enorme incerteza também do outro lado do Atlântico.
Economistas tradicionais, como Marta Norton, estrategista-chefe de investimentos da Empower, veem esses sinais como interessantes, mas ainda anecdóticos. Para ela, quedas em bordéis ou gorjetas menores podem ter alguma validade, mas seriam mais indicadores coincidentes do que antecedentes. Norton prefere olhar para fontes tradicionais, como lucros corporativos e o mercado de ações, e avalia que, pelos números clássicos, “a economia pode estar desacelerando, mas não enfrentamos uma recessão iminente. Ainda”.
Mesmo assim, a experiência mostra que medidas não convencionais podem revelar muito sobre a saúde da economia. O Stripper Index, assim como outros indicadores curiosos, talvez não substitua o PIB ou a taxa de desemprego, mas lembra que o humor do consumidor e seus pequenos cortes de gasto podem antecipar mudanças maiores no ciclo econômico.
O Stripper Index não está sozinho no panteão dos indicadores econômicos esquisitos. Vários outros índices alternativos já foram propostos, alguns até por nomes respeitados das finanças, para tentar prever recessões através de hábitos de consumo inusitados. Conheça alguns dos mais famosos:
Esses são apenas alguns exemplos. Há ainda o Índice da Barra da Saia (saias curtas em euforia, longas em recessões) e até o Índice dos Arranha-céus (a inauguração dos prédios mais altos do mundo costuma preceder crises). Embora nem sempre confiáveis, todos compartilham algo com o Stripper Index: traduzem, de forma criativa, como o consumo diário reflete o humor econômico.
No fim das contas, o Stripper Index começou quase como uma piada interna, uma maneira bem-humorada de comentar tendências econômicas. No entanto, por trás do tom sarcástico existe um fundamento real: a forte ligação entre os gastos supérfluos e a confiança na economia. Quando até quem vive das noites de diversão sente a ressaca chegando, talvez devêssemos todos prestar atenção.
Se há uma lição a tirar, é a importância de diversificar o radar ao tentar prever o futuro econômico. Enquanto os especialistas debatem modelos econométricos, o público comum pode olhar em volta e perceber sinais nas coisas mais triviais, desde a gorjeta do garçom até o movimento na boate local. Destigmatizar essas observações e encará-las como parte do mosaico de dados pode nos dar uma vantagem em antecipar problemas. Afinal, economia também tem a ver com sentimento, com psicologia coletiva. E poucas coisas refletem melhor o humor financeiro das pessoas do que a forma como gastam (ou deixam de gastar) seu dinheiro suado.
Em resumo, o Stripper Index nos lembra que indicadores podem vir de qualquer lugar, até do palco de um clube noturno. Por mais inusitado que seja, ele reforça a velha máxima: “siga o dinheiro”. Se o dinheiro parou de dançar nas noites de diversão, talvez esteja na hora de preparar o guarda-chuva… porque a tempestade econômica pode estar se formando no horizonte. E da próxima vez que alguém rir ao ouvir que strippers previram a recessão, lembre-o de que a realidade econômica, às vezes, dança conforme uma música bem irônica.