A política monetária tem sido o centro das atenções em praticamente todas as economias modernas. No Brasil, cada movimento do Banco Central em relação à taxa Selic provoca reações imediatas no mercado financeiro, nos preços ao consumidor e até no humor dos investidores. Decisões sobre juros, liquidez e crédito não ficam restritas ao campo técnico: elas afetam diretamente a vida de empresas e famílias.
Ao longo das últimas décadas, a relação entre política monetária, inflação e mercado de ações ficou cada vez mais evidente. Períodos de forte alta nos juros coincidiram com retração da atividade econômica e queda na bolsa, enquanto fases de flexibilização monetária trouxeram mais liquidez, expansão do crédito e valorização dos ativos de risco. Esse fio condutor ajuda a entender por que a Selic e o comportamento do Banco Central se tornaram variáveis observadas quase em tempo real por analistas, gestores e investidores.
Os governos costumam atuar na economia através de dois tipos de política econômica: a política monetária e a política fiscal. Esta é responsável por alterar o orçamento do Estado, isto é, receitas e gastos, e, no Brasil, é atribuição do Ministério da Fazenda. Desempenha um papel crucial nas contas públicas, na distribuição de renda e na estabilização macroeconômica.
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No caso da política monetária, os instrumentos mais utilizados são: a taxa de juros definida pelo Banco Central (taxa Selic) e a quantidade de moeda em circulação na economia. O objetivo primordial da política monetária é o controle de preços, isto é, combater a inflação, e também garantir um crescimento econômico sustentável e de longo prazo. É de suma importância que ambas as políticas estejam de acordo, para que sejam eficientes de forma conjunta. Além disso, em alguns países o foco pode mudar.
A Europa concentra-se principalmente no combate à inflação (meta de 2% ao ano a médio prazo), enquanto os Estados Unidos também dão peso ao crescimento econômico, de acordo com a chamada Regra de Taylor.
A política monetária e fiscal variam conforme o estado do ciclo econômico. Na Macroeconomia, o ciclo econômico pode ser compreendido como o hiato do produto (ou output gap, em inglês) e suas oscilações. Tal hiato é definido pela diferença entre o PIB real observado no período e o PIB real natural (ou tendência do PIB).
Existem dois tipos principais de abordagem da política monetária, que influenciam diretamente a atividade econômica e os setores de mercado:
Caracterizada pela redução da taxa básica de juros (no Brasil, a Selic), visando estimular o crédito, o consumo e os investimentos.
Quando a Selic cai, a renda fixa perde atratividade relativa, o crédito fica mais barato e investidores buscam ativos de maior risco, como ações. Isso impulsiona o apetite por risco e favorece setores dependentes do crédito e da confiança do consumidor, como varejo, construção civil, tecnologia e consumo discricionário.
Envolve o aumento da taxa de juros, com o objetivo de conter a inflação, reduzir o consumo e desacelerar o ritmo da economia.
Quando a Selic sobe, os rendimentos da renda fixa se tornam mais atrativos, o custo de contrair crédito aumenta e o apetite por ações tende a cair. Setores como varejo, construção e bens duráveis são os mais afetados negativamente. Já setores como bancos podem ter ganhos no curto prazo devido à ampliação do spread bancário, embora a demanda por crédito diminua.
No Brasil, essas decisões são tomadas pelo Copom (Comitê de Política Monetária), que se reúne periodicamente para definir o nível da Selic.
O Instituto Brasileiro de Economia (IBRE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV) publica muitas análises de indicadores econômicos, dentre os quais estão os relacionados ao PIB e ao hiato do produto. Neste gráfico acima podemos analisar o PIB potencial, efetivo e o output gap de 1983 a 2022 no Brasil. Como exemplo, os anos de 2008 e 2020 registraram uma forte desaceleração econômica e um hiato negativo, isto é, o PIB efetivo ficou abaixo do potencial.
Desse modo, analisar o Hiato do Produto é fundamental para entender e diagnosticar o estado atual da economia, além de sinalizar ao governo qual política (monetária ou fiscal) ele deve seguir a fim de reduzir ou aumentar o gap.
Além disso, é essencial para as decisões das taxas de juro. Como exemplo, em caso de um output gap positivo e muito elevado, devido ao risco de uma pressão inflacionista, o Banco Central tende a aumentar os juros para contrair a economia. Assim, aumentos ou reduções dos juros impactam a procura e a oferta agregada e as decisões dos agentes econômicos de poupar, consumir e investir.
Mudanças na taxa Selic afetam diretamente o custo do capital e os retornos esperados dos investimentos.
Historicamente, períodos de Selic baixa têm favorecido a valorização do Ibovespa, enquanto que a Selic alta costuma pressionar o índice para baixo. Por exemplo, entre 2017 e 2019, a queda gradual da Selic coincidiu com forte valorização da bolsa brasileira; já em 2015, com Selic acima de 14%, o mercado acionário enfrentou queda. Portanto, tendencialmente, há uma correlação empírica inversa entre a Selic e o Ibovespa.
Além disso, o impacto da política monetária varia de acordo com os setores:
Como já explicado, a política monetária é uma ferramenta-chave no controle da inflação. Quando os preços sobem rapidamente, o Banco Central tende a elevar os juros para conter a demanda, protegendo o poder de compra da moeda e desacelerando a economia. Um nível de inflação elevado corrói o rendimento real dos investimentos e pode reduzir o consumo, afetando o lucro das empresas listadas na bolsa.
Mudanças nos juros também influenciam a entrada e saída de capital estrangeiro.
Criada pelo economista americano John Taylor, em 1993, após observar as decisões de política monetária das economias desenvolvidas em um conjunto de anos, a Regra de Taylor considera que as decisões de juro são fundamentalmente para enfrentar dois principais desafios da política monetária: Estabilidade de preços e redução de possíveis output gaps.
Ou seja, a taxa de juro objetivada pelo Banco Central é a que corrige os desvios da inflação face à meta inflacionária e/ou que reduz o hiato do produto, dependendo do peso que o BC coloca em cada um dos dois desafios, chamado de Grau de reatividade do Banco Central. Como exemplo, o Banco Central Europeu prioriza a estabilidade de preços e tem uma meta inflacionária de 2%. (portanto, pela Regra de Taylor: 𝛽𝜋 > 𝛽𝑌)
No caso brasileiro, o Banco Central também observa indicadores como inflação projetada, atividade econômica e expectativas do mercado antes de decidir o nível da Selic.
Se deseja entender em detalhe como funciona a Regra de Taylor e sua aplicação no Brasil e no exterior, confira nosso artigo completo sobre a Regra de Taylor
Investir em produtos financeiros implica um certo nível de risco.